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Arquivo mensal: dezembro 2016

A curadoria na era digital e o Moments do Twitter

Com o digital e a internet, o público que antes era apenas receptor, começou a ser mais ativo e a também produzir conteúdo, sendo reconhecido como prossumidor (FERRÉS; PISCITELLI, 2015).

Agora, mais do que nunca, há a produção de uma grande gama de informações, o que torna praticamente impossível a uma pessoa acessar todo tipo de dados produzidos. Isso traz a necessidade de alguma forma de curadoria que selecione a informação relevante para cada tipo de indivíduo. Atualmente, essa curadoria tem sido realizada por meio de algoritmos. Mas as pesquisadoras Corrêa e Bertochi (2012a, 2012b) defendem que essa não é a melhor maneira, tendo em vista que os algoritmos só reconhecem as ações passadas dos indivíduos, fazendo com que fiquem fechados apenas em suas preferências.

Para as autoras, faltaria ainda ao algoritmo a perspectiva do humano, a visão do futuro, essencial para um trabalho de curadoria, o qual deve ser realizado idealmente em conjunto entre algoritmos e humanos. Elas defendem que, apesar dessa ação poder ser exercida por qualquer pessoa, deve ser praticada preferencialmente pelos comunicadores, pela sua experiência e visão de mundo.

E desafiando a tendência atual de curadoria por algoritmos, desde novembro de 2015, o Twitter no Brasil deu início ao Moments, uma ferramenta de curadoria executada apenas por humanos. Trata-se de um botão em formato de raio presente na rede social que, quando acessado, apresenta uma seleção com os principais tópicos que estão em discussão no Twitter, dividos por assuntos como “Hoje”, “Diversão”, “Entretenimento, “Esportes”e “Notícias”.

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Segundo o diretor editorial do Twitter na América Latina, Leonardo Stamillo¹, a seleção é efetuada por duas equipes de jornalistas, comandadas por ele, sem auxílio de ferramentas de computador. Ele explica que as informações selecionadas por meio de curadoria poderão ser aproveitadas não só por usuários comuns, mas também pelas empresas jornalistas, que terão a oportunidade de pautar suas atividades conforme as têndencias em alta apontadas pelo Moments (informação verbal).

Quando a ferramenta foi lançada, o blog do Twitter trouxe um post dizendo que alguns conteúdos do Moments seriam produzidos também por parceiros: BuzzFeed, EGO, Esporte Interativo, Estadão, Fantástico, G1, GloboEsporte.com, Gshow, Jornalismo da Band, Multishow, Rede Globo e Veja. Na época, a rede social informou ainda que entraria em operação o Promoted Moments, um espaço para as divulgação de marcas. Os primeiros parceiros eram Johnny Walker, Coca-Cola, Nissan e TIM.

A iniciativa do Moments, apesar de pouco tempo em operação, reforça as ideias de Corrêa e Bertochi: nenhum algoritmo pode superar a perspectiva que só os humanos oferecem. Os algoritmos podem facilitar a seleção de dados, mas o Moments indica que o trabalho de profissionais da comunicação pode ser feito até mesmo sem o auxílio deste instrumento. É o humano mostrando que tem um papel relevante diante da máquina.

 

*1 Informação obtida na mesa de debate Narrativas e Jornalismo Internacional, com a participação da professora Dulcilia Buitoni, da ECA/USP, da editora-chefe do EL PAÍS Brasil, Carla Jimenez, e do diretor editorial do Twitter na América Latina, Leonardo Stamillo, no II Simpósio Internacional Jornalismo em Ambientes Multiplataforma, na Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM/SP), em 22 de novembro de 2016.

 

Referências

CORRÊA, Elizabeth Saad; BERTOCCHI, Daniela. O Algoritmo Curador: O papel do comunicador num cenário de curadoria algorítmica de informação. In CORRÊA, Elizabeth Saad (Org). Curadoria digital e o campo da comunicação. São Paulo: Escola de Comunicações e Artes – Universidade de São Paulo, p. 22-39, 2012a. Disponível em: <https://issuu.com/grupo-ecausp.com/docs/ebook_curadoria_digital_usp&gt;. Acesso em 26 dez. 2016.

______. A cena cibercultural do jornalismo contemporâneo: web semântica, algoritmos, aplicativos e curadoria. Matrizes, São Paulo, Ano 5, n. 2, p. 123-144, jan./jun. 2012b. Disponível em: <http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/MATRIZes/article/viewArticle/8141&gt;. Acesso em 26 dez. 2016.

FERRÉS, Joan; PISCITELLI, Alejandro. Competência midiática: proposta articulada de dimensões e indicadores. Tradução: Amanda Cadinelli, Amanda Cordeiro Padilha e Carla Gonçalves. Revisão: Ana Inés Garaza, Vitor Lopes Resende e Gabriela Borges. Lumina, Juiz de Fora, v. 9, n. 1, p. 1-16, jun. 2015. Disponível em: <https://lumina.ufjf.emnuvens.com.br/lumina/article/view/436&gt;. Acesso em 8 jun. 2016.

As fanfics e os invasores do texto

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Fanfics: porque a história não está concluída até que nós digamos.

Fanfics é a abreviação do termo em inglês fanfictions, que significa ficção dos fãs. São grupos de aficionados por uma série de TV, livro, filme que, utilizando os personagens ou tramas destas obras, constroem suas próprias narrativas. Ao digitar a palavra no Google, a pesquisa mostra mais de 54 milhões de citações ligadas ao tema, ou seja, as possibilidades e variedade de abordagens são imensas. Tal abundância denota a importância que a participação dos fãs possui na cultura pop atual.

No livro “Os invasores do texto”, Henry Jenkis aborda os fãs como produtores e criadores de sentido. Eles não se contentam mais em seguir seus ídolos, colecionar fotografias e inscreverem-se em fã clubes. Eles querem criar dentro das histórias que já existem.

“Henry Jenkins rejeita os estereótipos do fã ingênuo, do fã socialmente deslocado e do fã consumidor sem cérebro, buscando representar os fãs como produtores ativos e peritos em manipular os significados dos programas que assistem. Eles são como nômades invasores, que constroem sua cultura a partir daquilo que tomam de empréstimo, como uma comunidade social alternativa definida por suas preferências culturais e práticas de consumo.”

 

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A franquia é exemplo de fanfic que rompeu o cordão umbilical que a ligava à obra mãe: a saga Crepúsculo (imagem: Portal 50 tons)

Uma das maiores evidências do alcance dos fãs como produtores são os vários livros já publicados e que se baseiam em histórias criadas em fanfics. Talvez a mais notória destas ascensões seja “Cinquenta tons de cinza”, que além de ter se tornado um best-seller mundial, foi adaptado para o cinema. A autora, E L James, é uma super fã de Crepúsculo e teria começado a delinear os contornos de sua história em uma fanfic. Inclusive, antes de se tornarem um dos casais sadomasoquistas mais conhecidos do cinema, Anastasia Steele e Christian Grey teriam os mesmos nomes dos principais personagens da saga vampiresca, Bella e Edward.

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Comentários de leitores sobre “Harry Potter e a criança amaldiçoada” no site Skoob: apenas uma fanfic?

A influência dos fãs é tão forte que eles podem estar se tornando fonte de inspiração para muitos autores. Um exemplo recente e que tem gerado discussões de sites especializados em reviews e críticas de livros é a continuação da história do bruxo mais famoso do mundo, Harry Potter e a criança amaldiçoada. Nele, a narrativa é retomada do ponto onde o livro anterior foi encerrado: na estação de King’s Cross, 19 anos depois da Batalha de Hogwarts. Segundo os críticos, a história destoa muito dos livros anteriores, os personagens estão descaracterizados e os laços que unem a trama são muito frágeis, dando a impressão de que os autores “forçaram a barra”. Apesar de o livro ser a transcrição do script da peça de teatro encenada em Londres e, diga-se de passagem, escrita por mais dois autores além de J.K. Rowling, Harry Potter e a criança amaldiçoada parece muito como uma produção de fanfic. Por estes motivos, alguns dizem que este livro não pode ser considerado uma continuação da saga.

Os fãs invadiram um espaço que antes era digno somente de cineastas e escritores e passaram a criar histórias a partir de seus personagens preferidos. Sua paixão é como uma religião, porém, ao contrário da vida real, seus ídolos são flexíveis e seguem a imaginação e a iniciativa de seus seguidores apaixonados.

Referências:

JENKINS, Henry. Invasores do texto. Fãs e cultura participativa. São Paulo: Marsupial, 2015.

Resenha sobre o livro Invasores do texto. Disponível em https://www.skoob.com.br/livro/pdf/invasores-do-texto/livro:530072/edicao:538420. Acesso em 24 dez.2016.

Sherlock: teasers como uma estratégia de aproximação com os fãs

Mais um início de ano chegando e com ele muitas séries voltam às TVs e à internet, para a alegria dos fãs. Entre elas está Sherlock, que após 2 anos de hiato, retorna para a 4ª temporada em 2017. Transmitida pela BBC nos Estados Unidos e pelo canal pago Arte 1 no Brasil, a série teve seu primeiro episódio exibido em julho de 2010 e é baseada nas histórias escritas por Sir Arthur Conan Doyle sobre o “detetive consultor” Sherlock Holmes e seu amigo Doutor John Watson, interpretados por Benedict Cumberbatch e Martin Freeman, respectivamente.

É interessante observar que mesmo após um longo tempo de pausa, os fãs permanecem atentos e à postos, prontos para decifrar, ao estilo Holmes, os mistérios que surgiram durante o ano em torno da nova temporada. De forma hábil, a BBC também soube dar aos telespectadores pistas sobre o que esperar desse tão aguardado retorno.

Em novembro a produtora britânica divulgou um novo teaser onde é possível observar os protagonistas sentados em suas habituais poltronas no apartamento 221B da Rua Baker, entretanto, para os mais atentos, muitos easter eggs estavam à margem da imagem, no subtexto da tela, prontos para serem decifrados. O portal Sherlock Brasil esmiuçou a imagem para os fãs, em buscas de pistas e possíveis descobertas. O portal conta ainda com uma aba de Teorias, onde os fãs podem se aventurar mais afundo nos mistérios ocultos de Sherlock.

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O facebook oficial da série está liberando na última semana uma série de teasers e pequenos fragmentos da história para o público, que tem interagido fortemente em contrapartida. Entre eles, o post “Someone is out there. Something is coming” divulgado em 24 de dezembro de 2016, alcançou em média 1.2 milhões de visualizações, 70 mil reações e mais de 8 mil compartilhamentos.  O teaser em questão faz referência ao principal antagonista de Sherlock, que todos acreditavam estar morto.

Entre os mais de 2.300 comentários do vídeo, podemos observar que muitos evidenciam a empatia, a expectativa e a ansiedade dos fãs para o retorno da história, no dia 01 de janeiro de 2017. Mais do que uma estratégia de marketing digital automática e fria, esses teasers demonstram como o laço entre fã e o ídolo é algo que, cada vez mais, merece uma atenção dedicada e especial dos estudiosos de mídia. Esses fãs não apenas visualizaram mais de 1 milhão de vezes o vídeo, eles fizeram questão de comentar e reagir ao conteúdo divulgado, ou seja, clicar em um dos 6 “reactions” disponíveis e mostrar como efetivamente se sentiam ao assistir o teaser.

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Nos resta, como acadêmicos, estarmos atentos e sensíveis o suficiente para estudar e decodificar os inúmeros sinais que os fãs da mídia transmitem todos os dias, a fim de ajudarmos a construir uma comunicação mais igualitária e de qualidade, onde todos os lados estejam alinhados e possam funcionar de forma harmônica, produzindo conteúdos cada vezes mais dialógicos, engajados e atualizados com esse novo e antenado consumidor de produtos midiáticos.

Karina Menezes Vasconcellos – Mestranda em Comunicação e Sociedade PPGCom UFJF

A internet e o incentivo da nova curadoria

Em uma rápida pesquisa é possível descobrir que o termo “curadoria” significa um grupo de pessoas com a finalidade de debater, organizar e realizar eventos, ações, promoções ou demais situações que necessitam ser planejadas. A palavra “zelo” é frequentemente citada nas explicações, talvez porque o que mais motiva uma curadoria, é o carinho e a importância que esse grupo ter em oferecer conteúdo exclusivamente designado para um fim.

O termo geralmente é associado a museus, mas em tempos de internet tomou um novo rumo. Dentro de seus vários desdobramentos, em grupos de interesses e sites, a curadoria virou também sinônimo de novos negócios. Como exemplos disso temos o TAG Experiências Literárias, um clube de livros por assinatura; BeautyBox, oferecendo produtos de beleza; Omelete Box, com produtos da cultura pop e nerd e o Mubi, conhecido como o “Netflix cult”.

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Uma das caixas mensais da TAG

Todos esses serviços partiram de sites ou grupos de interesses que se tornaram gigantescos com as trocas de informações a ponto de ter um público cativo interessado em pagar uma taxa mensal para receber produtos selecionados, sejam físicos ou não. A curadoria parte do princípio de que todos esses serviços são selecionados por estranhos, pessoas que você nunca viu antes e você paga para receber produtos indicados por ele. São exemplos de que aquela sugestão da Amazon, que aparece porque você viu tal produto, provavelmente deve gostar desse outro também, pode ser levado ao nível mais orgânico. A troca vem de um nicho pelo qual o consumidor se identifica, ele quer indicações muito além das que são trocadas por algoritmos.

Mas nem sempre a curadoria tem que terminar com um produto físico. É o caso do Mubi. A incansável busca e decepção em encontrar filmes considerados cult na Netflix, gerou o Mubi. Lá você paga uma assinatura mensal e tem a sua disposição uma série de filmes que passam bem longe de Hollywood. Como clássicos “Apocalypse Now”, do Coppola, “Cidadão Kane”, Orson Welles, “Persona” do Bergman,Kubrick, Godard, Almodóvar mais de 1200 títulos nacionais. Porém, não é possível selecionar para sempre o que deseja ver. Os 30 filmes disponíveis mudam a cada mês, fazendo com que quem consome o serviço tenha que ficar atento sempre ao que deseja assistir.

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Site do Mubi

Serviços como esses só se tornam possíveis porque há uma necessidade latente do humano por trás do algoritmo. Não basta indicar por causa do banco de dados, é necessário debate, conversa, seleção, coisas que provém de grupos online de interesse. São conceitos extremamente conhecidos sendo aplicados de maneiras completamente novas, como é feito a grande parte da produção online.

Kony 2012: um exemplo de ativismo e participação nas redes… #SQN

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Um dos exemplos mais intrigantes citados no capítulo 6 do livro Participatory Culture in a Networked Era (Henry Jenkins, Mizuko Ito e Danah Boyd) foi o do documentário Kony 2012. Nele, a ONG Invisible Childrens lançou o projeto, homônimo ao vídeo, que denunciava Joseph Kony, que seria um sanguinário guerrilheiro ugandense que sequestrava crianças de seu país para integrar seu exército denominado Lord’s Resistance Army (LRA). Divulgado principalmente via YouTube, o vídeo de 30 minutos muito bem produzido e editado denunciava as atrocidades praticadas por Kony e seu exército contra as crianças ugandenses e defendia uma ação militar contra o suposto guerrilheiro e  sua organização paramilitar.

Lançado em 05 de março de 2012 o documentário foi o maior viral na internet da época, em apenas 4 na rede alcançou mais 70 milhões de views no youtube, com uma narrativa consistente e linear o vídeo evidencia uma Uganda que precisa realmente da ajuda de todos para conter o “monstro” Joseph Kony. Ao final a solução para essas atrocidades é apresentada: a prisão de Kony com ajuda de intervenção militar dos EUA e a doações em dinheiro para que as crianças ugandenses fossem amparadas pelo ONG. Assista na íntegra o documentário aqui.

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Como podemos perceber no vídeo acima, o projeto Kony 2012 ganhou aspecto de marca, com produtos como canetas, bottons, camisas, pulseiras e posters. A “causa” proposta no vídeo  foi aderida por muitas pessoas que passaram a divulgar e contribuir financeiramente, inclusive famosos como Rihana, por exemplo. E também chegou às autoridades americanas que, por sua vez, se dispuseram a ajudar. Porém, mesma intensidade do sucesso do vídeo surgiram as críticas, não somente ao vídeo em si, mas também a ONG Invisible Childrens. As principais e mais fortes contestações do conteúdo exibido pelo vídeo partiram dos próprios moradores de Uganda, que negavam a existência da realidade mostrada no vídeo.

O maior questionamento com relação à campanha é o de que o então acusado de tantas atrocidades não vivia em Uganda e estava desaparecido desde o ano de 2006. O país não vivia mais a realidade mostrado no vídeo a 6 anos. Não que ele não tivesse feito o que estava sendo acusado, mas essa não era a realidade daquele momento no país, inclusive os ugandenses afirmavam em diversos vídeos e tweets, que foram publicados por eles posteriormente, que os problemas do país eram outros.

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A partir das críticas geradas com o documentário, a ONG Invisible Childrens também virou alvo de críticas e especulações, a principal delas é de que a instituição não tinha uma boa reputação no quesito transparência ao gastar o dinheiro arrecadado em suas campanhas humanitárias, segundo a Charity Navigator que é a mais antiga e maior organização não governamental de fiscalização de outras Ongs. Com a campanha Kony 2012 a ONG arrecadou US$13,7 milhões e gastou cerca de US$9 milhões com despesas de pessoal e viagens, segundo a organização fiscalizadora, somente 37% foram destinados para as obras de caridade que assiste. A instituição lançou outros vídeos afirmando que suas informações e intenções eram verdadeira e que a falta de transparência financeira era mentira.

Em meio a tantas acusações e questionamentos o que mais chama a atenção foi quantidade de pessoas envolvidas  por essa campanha. E muitas das pessoas que participaram do vídeo foram instigadas pela causa em si sem se preocupar com a veracidade dos fatos. No capítulo 6 do livro Participatory Culture in a Networked Era, os autores destacam justamente isso, a grande participação das pessoas que foram convencidas pelos ativistas sociais da Invisible Childrens da importância da causa, sem sequer pensar criticamente sobre o assunto.Em contrapartida, outras pessoas que em consequência do vídeo também participaram da campanha de outra forma, para expor suas críticas e indignações com relação ao conteúdo mostrado e falar dos verdadeiros problemas de Uganda naquele momento.

Não resta dúvidas que a campanha  é um exemplo de ativismo e participação nas redes. Porém, fica evidente que com todos os seus desdobramentos apresentados, o ativismo real não partiu da campanha Kony 2012, mas sim das pessoas que, mesmo de forma individual, passaram mostrar principalmente no youtube e no twitter que a realidade de Uganda era outra, que o país tinha outros problemas que não Joseph Kony e que as intensões da ONG Invisible Childrens e dos EUA não estavam muito claras com relação ao seu país.

 

Texto do grupo: Gilson Peres, Lais Roxo e Liliane Oliveira

Referências:

JENKINS, H; IKO, M; BOYD, A. Participatory Culture in a Networked Era.  Cambridge: Polity, 2016.

http://www.charitynavigator.org/

http://g1.globo.com/fantastico/quadros/detetive-virtual/noticia/2012/03/denuncia-contada-no-video-kony-2012-aconteceu-ha-10-anos.html

 



 

 

Usuários em evidência: Banco de Dados e Stranger Things

Todo mundo já se sentiu espionado por alguma plataforma digital com a qual interagiu. Quem nunca pesquisou sobre um tênis no Google e quase que imediatamente teve a timeline do Facebook “invadida” por anúncios das mais variadas lojas virtuais e sua caixa de e-mail começou a “misteriosamente” receber newsletters e promoções descrevendo o mesmo tênis que você havia procurado?

E quando além de nossas pesquisas, nossas preferencias também são acompanhadas e usadas pelas empresas digitais para criar produtos e serviços que serão “vendidos” para nós? Um caso atual que gerou comentários foi o da criação da série Stranger Things pela Netflix, que pode ter utilizado o Big Data (o processamento de diversos algoritmos que analisam o comportamento dos usuários) para identificar as preferencias do público que usa a plataforma de vídeos e assim criar a “série perfeita”.

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Como apontado pelo portal Meio & Mensagem; “As referências de clássicos como ET e Conta Comigo, a mistura de Alien com Carrie, Contatos Imediatos do Terceiro Grau com Evil Dead e Goonies com Poltergeist logo chamou a atenção dos fãs”. O mesmo portal destacou o post de Gustavo Miller, Digital Creative, em seu perfil do Linkedin, que escreveu que a série pode ter sido “a maior obra de arte do algoritmo da Netflix”.

Esse caso é mais uma indicação de que as informações que compartilhamos e cedemos são usadas por grandes corporações, gerando uma dualidade; que de um lado tem as corporações midiáticas “ouvindo” o espectador para produzir conteúdos realmente relevantes para o público em questão; mas que de outro lado representa uma “fiscalização” da privacidade a qual teríamos direito. Um acompanhamento de nosso comportamento e de nossos dados, os quais as empresas utilizam de forma ainda não clara.

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Não se trata apenas da Netflix, é claro. As informações que colocamos em nossos perfis no Facebook por exemplo também são armazenados pelo banco de dados da empresa, e como afirmou José Luis Vicente, no texto “Armazenando o eu: sobre a produção social de dados”; “o destino final de toda informação que a empresa conserva sobre a vida de um bilhão de pessoas de todo planeta é incerto, e a maneira como a administra é notoriamente obscura”.

Na era digital qualquer informação pode ser usada ou armazenada por bancos de dados espalhados pelo mundo. Essas informações chegam até esses bancos por meio de nosso comportamento digital, somos nós que contribuímos para o aumento de informações armazenadas e não sabemos ainda como esse conteúdo está sendo usado ou poderá ser usado.

VICENTE, José Luis. Armazenando o eu: sobre a produção social de dados In: BEIGUELMAN, Giselle e MAGALHÃES, Ana Gonçalves. (Org). Futuros Possíveis – Arte, museus e arquivos digitais. Peirópolis LTDA– 2014

[I] Disponível em: http://www.execplan.com.br/single-post/2016/08/11/Stranger-Things-A-rela%C3%A7%C3%A3o-entre-a-nova-s%C3%A9rie-do-Netflix-e-Big-Data : Acesso em 13/12/2016

[II] Disponível em: http://www.meioemensagem.com.br/home/midia/2016/08/02/stranger-things-e-o-uso-de-algoritmos-pela-netflix.html : Acesso em 13/12/2016

Eles deveriam ouvir a voz da internet? Um olhar sobre a crise de representação política no Brasil

A popularização do uso da internet no Brasil coincidiu (talvez não de forma acidental) com um momento político, econômico e social, bastante crítico. Hoje, cerca de 58% da população tem acesso à rede, número que cai se analisarmos a população por faixa de renda[i].

O paradoxo reside aí: apesar de estarmos cada vez mais conectados, um dos comportamentos marcantes do ano de 2016 é a intolerância para com o outro. Assistimos à eleição de um presidente dos EUA, maior economia mundial, fundamentada na construção de muros concretos, no caso do México, e simbólicos, no caso de Cuba. Assistimos a uma Europa sem saber como resolver a questão dos imigrantes exilados da guerra e da miséria na Síria, decidindo, por vezes, pela destruição, também simbólica, do outro, como no caso da proibição do uso de vestimentas tradicionais[ii]. O comportamento, porém, não é novidade. Apenas vem sendo reeditado. Maquiavel certa vez disse “Aos amigos, tudo. Aos inimigos, a lei”, frase que, séculos depois, teria sido usada também por Getúlio Vargas.

No campo virtual, o enfrentamento ganha dimensões ainda maiores. A descoberta de escândalos de corrupção, atrelada a outros fatores, leva a uma crise de representação política que tem como consequência o esmorecimento da confiança em nossas instituições.

Na semana passada, enquanto o país estava desmobilizado por conta da morte de atletas e jornalistas num trágico acidente aéreo, a Câmara de deputados aprovava um conjunto de medidas anticorrupção desvirtuado da proposta inicial, que havia sido discutida com a população. Soou como um golpe pelas costas. No último domingo, as manifestações pediam o afastamento do presidente do senado, Renan Calheiros, réu e acusado de diversos crimes[iii]. Na segunda, o ministro do STF Marco Aurélio Melo decide pelo afastamento do presidente do Senado, após pedido feito pela Rede. Renan não recebe o oficial de justiça e a decisão foi encaminhada para votação no STF, onde foi decidido que ele poderia continuar no cargo[iv]. Já se ouve por aí que se o presidente do senado pode descumprir ordem judicial, qualquer um pode.

A questão é discutida por Carlos Eduardo Valderrama em “Cidadania e formação cidadã na sociedade da informação” (2014). Para o autor, um dos fatores que desencadearam esse processo foi o avanço neoliberal das empresas privadas. Nessa dinâmica, temos como agravantes uma ineficiente formação cidadã, que se dá muitas vezes no seio de instituições escolares pautadas pela dinâmica do capital e uma mídia que, atendendo aos anseios do mercado, contribui na disseminação de informações com um único viés.

É indispensável que o acesso à informação esteja disponível a um número cada vez maior de pessoas. Anular a voz do outro não contribui para o avanço da democracia. Contudo, Ferrés (2014) assinala a existência de níveis de participação, onde há certo controle social em situações em que se observa uma sensação de liberdade. Nos níveis aparentemente primários de participação, Ferrés aponta que a participação emocional é ferramenta usada para a identificação e projeção de uma determinada causa. Isso, de certa forma, ajuda a explicar o momento de polarização em que vivemos. O autor defende ainda que o surgimento de novas tecnologias que possibilitam a participação em massa não implica, necessariamente, no engajamento cidadão.

Por isso, Valderrama (2014) sustenta que a qualidade da interação nas redes é fator primordial. Nesse contexto, a própria configuração da rede permite o surgimento de novas formas de resistência, provenientes da combinação de informação disponível. Sendo assim, a mobilização popular, quanto mais se aproxima da autonomia, ganha força política para alcançar resultados importantes para a sociedade como um todo.

 

[i] Disponível em: http://www.brasil.gov.br/ciencia-e-tecnologia/2016/09/pesquisa-revela-que-mais-de-100-milhoes-de-brasileiros-acessam-a-internet. Acesso em 08/12/2016.

[ii] Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/mundo//2016/12/1838867-merkel-defende-proibicao-do-uso-do-veu-is/lamico-na-alemanha.shtml. Acesso em: 08/12/2016.

[iii] Disponível em: http://brasil.elpais.com/brasil/2016/12/04/politica/1480851119_260722.html. Acesso em 08/12/2016.

[iv] Disponível em: http://g1.globo.com/politica/noticia/maioria-do-stf-vota-pela-permanencia-de-renan-calheiros-na-presidencia-do-senado.ghtml. Acesso em 08/12/2016.

Referências

FERRÉS, J. Educomunicação e cultura participativa. In: APARICI, R. (Org.) Educomunicação: para além do 2.0. Tradução de Luciano Menezes Reis. São Paulo: Paulinas, 2014.

VALDERRAMA, C. E. Cidadania e formação cidadã na sociedade da informação. In: APARICI, R. (Org.) Educomunicação: para além do 2.0. Tradução de Luciano Menezes Reis. São Paulo: Paulinas, 2014.

O que um Pony faria? O fandom adulto de My Little Pony como ativismo dentro de desenhos animados.

O ativismo dentro de um fandom é um tema amplo estudado por teóricos como Henry Jenkins, e no Brasil, Adriana Amaral. Em nossos últimos exemplos vemos a iniciativa Harry Potter Alliance ser apresentada, mas nesta publicação em específico falaremos sobre o ativismo que se dá através de um desenho infantil clássico dos anos 80, My Little Pony.

My Little Pony teve sua primeira versão lançada em 1984, uma animação infantil, voltada para crianças entre cinco e dez anos de idade que contava a história de um grupo de ponies (garotas). Em 2010 o desenho foi relançado com um novo design, mas ainda o foco no mesmo público infantil. O que a Hasbro (detentora da marca) não imaginava era que My Little Pony de 2010 arrecadaria mais fãs do que o de 1984 incluindo adultos que se organizavam e se tornavam ativos em uma comunidade, um fandom.

Como hipótese citamos aqui dois dos possíveis motivos que trouxeram para MLP esse novo público. O primeiro, os fãs de 1984 já eram adultos em 2010, tendo aproximadamente 30 anos, o que explicaria o acesso difundido ao conteúdo infantil tendo assim interesse do público original. Como segunda hipótese, My Little Pony: A Amizade é Mágica (nome da versão de 2010) surgia em uma época onde as animações infantis já começavam a fazer parte do universo adulto através de desenhos como A Hora de Aventura (2010), Mundo de Gumball (2011), Apenas Um Show (2010) que mesclavam o interesse infantil a temas e piadas subentendidas do universo adulto.

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My Little Pony: A Amizade é Mágica ainda faz parte de outro grupo de desenhos que na decada de 2010 fez muito desenhos, algo que vamos chamar aqui de “desenhos good vibes”. Desenhos que fazem seus espectadores se sentirem bem consigo mesmo, e tratam de assuntos importantes com leveza, como Steven Universe (2013).

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É justamente através do seu subtítulo, A Amizade é Mágica que a comunidade de fãs de MLP se organiza em mais do que um fandom, mas uma comunidade segura e de amparo, sendo receptivo a diversidade de qualquer fã. Bronies (fãs masculinos, brothers + ponies) e Pegasis (fãs femininos, Pegasos + Sister) passam a agir sobre o lema “o que um pony faria?”, fazendo com que as atividades e atitudes dessa comunidade se organize através de boas intenções e principalmente, a amizade, o que naturalmente fortalece assim o próprio fandom.

Como exemplo de ativismo dentro do fandom de MLP podemos citar a personagem Rainbowdash, considerada por muitos símbolos da vertente LGBT deste fandom. Rainbowdash é uma das seis ponies protagonistas, e representa muito bem as pessoas LGBT não só por seu símbolo (cute mark) ser um arco-íris (também símbolo do movimento LGBT) mas por ela mesma ser uma quebra de esteriótipos. Rainbowdash é a mais masculina das personagens, com gostos também entendidos como do universo masculino, como velocidade e aventura, até mesmo sua dubladora possui uma voz mais agênera.

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Por ser um desenho com muitas personagens masculinas a shippagagem, ou seja, a torcida e o incentivo a casais não necessariamente canônicos na trama, também são um exemplo de como a comunidade LGBT se estabelece dentro da comunidade de fãs de MLP. Para Amaral, Souza e Monteiro (2014) “A importância social de uma shippagem intensa dos fãs se referindo e mencionando casais gays nas plataformas, acentua o valor de tal mobilização, que tem origem no que críticos ainda convencionam chamar ‘entretenimento fútil’”.

Essa comunidade ainda tem como costume ações de arrecadamento de materiais e dinheiro para instituições beneficentes, grupos de apoio a minorias e é claro, celebração do que é diferente, afinal, as seis amigas de My Little Pony são completos opostos.

Seja na celebração da diversidade de gênero, na torcida por casais homossexuais, no incentivo a ajuda e na presença como forma de apoio o fandom de MLP só tem a ganhar recebendo em sua comunidade mais do que crianças, mas adultos capazes de organizar toda essa estrutura do bem.

Comic Con Experience e o universo expandido da cultura pop

Entre os dias 1º e 4 dezembro de 2016 o São Paulo Expo recebe a terceira edição da CCXP – Comic Con Experience, evento que reúne fãs e entusiastas da cultura pop mundial, uma verdadeira referência para amadores e profissionais que atuam nos quadrinhos, séries de TV, videogames e cinema. A primeira edição do evento aconteceu no final da década de 1960 nos Estados Unidos e procurava reunir inicialmente fãs de quadrinhos, oferecendo a eles um espaço onde pudessem compartilhar sua paixão por esse universo. Com a popularização de outras mídias de comunicação de massa, o crescimento da TV, o cinema e os jogos eletrônicos, o encontro evoluiu e ganhou os contornos que apresenta hoje, sendo um evento obrigatório para todos os aficionados pela cultura pop.

Atualmente, as maiores comic cons do mundo são as de San Diego, Nova Iorque e Salt Lake City (as três nos Estados Unidos). Em seu terceiro ano consecutivo no Brasil, a CCXP Comic Con Experience está se estabelecendo como a maior da América Latina e a terceira maior das Américas, mostrando que o público brasileiro leva muito a sério sua paixão pelo mundo da cultura pop. O evento estima que aproximadamente 180 mil pessoas visitem os inúmeros estandes e painéis durante os quatro dias de convenção.

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Imagem: Google

É interessante observar o que, afinal, está por trás de números tão expressivos. Mais do que apenas trazer os grandes artistas que estão por trás dos super heróis que toda uma geração aprendeu a acompanhar e amar nos quadrinhos e nas telas de cinema, a CCXP oferece a esses fãs a oportunidade de interagirem física e emocionalmente com um imenso e palpável universo expandido. Pergunte a um veterano fã de Star Wars o que ele acharia de, por alguns instantes, se sentar na cadeira de comando da Millennium Falcom, ou questione um jovem adulto sobre a oportunidade de ver, em tamanho real, as armaduras de ouro dos Cavaleiros do Zodíaco. Essas são experiências reais que o evento oferece durante esta semana em São Paulo.

Talvez, a compreensão sobre o quanto a experiência da CCXP pareça tão sedutora aos olhos e sentidos de milhares de pessoas, passe por uma compreensão sobre o que Jenkins (2014) chama de “fandon forense”, termo criado pelo professor de estudos de mídia do Middlebury College, Jason Mittell. Segundo o professor Mittell, o fandom forense está presente em programas onde o enredo abre espaço para um aprofundamento mais complexo da narrativa, incentivando o engajamento do público com aquele conteúdo midiático. Ou seja, quanto mais “aprofundável” for determinada história, mais espaço de engajamento e desenvolvimento o fandom forense encontrará.

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Comic Con San Diego 2016

O crescimento dos universos expandidos de diversas sagas está criando um ambiente muito favorável para esse tipo específico de fandom crescer e interagir. Vale lembrar que o Universo Expandido inclui livros, histórias em quadrinhos, jogos de videogame, filmes oficiais, séries de televisão, brinquedos e outras mídias remixadas do conteúdo original. E hoje, mais do que na distante década de 1960 quando a CCXP dava timidamente seus primeiros passos, a popularização da mídia como um todo em diversas plataformas, permite que essas histórias transmidiáticas que compõe os universos expandidos cheguem mais rapidamente aos fãs, que estão mais antenados do que nunca em suas sagas preferidas.

Oferendo em um só lugar, produtos, experiências, cenários e artistas badalados, a CCXP Expirience acerta em cheio no gosto e no coração desse público, mostrando que existe um grande mercado, cada vez mais atento, aos fandons engajados e comprometidos de nossa era conectada e interativa.

Karina Menezes Vasconcellos – Mestranda em Comunicação e Sociedade PPGCom UFJF

Referência

JENKINS, Henry. Cultura da conexão. São Paulo: Aleph, 2014.

 

A fotografia na era do Meme: o fenômeno da cocriação

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Richard Dawkins, pensador da Teoria dos Memes, sendo vítima de sua própria criação (Fonte: Know your Meme)

Se você não sabe o que é um Meme, certamente já se divertiu com eles em algum momento.  A palavra “Meme” deriva-se do termo Memética, teoria proposta pelo biólogo Richard Dawkins. De forma bastante simplificada, a teoria de Dawkins afirma que as ideias (ou o Meme) podem ser contagiosas e, para sobreviver, devem atingir, tal como um vírus, o maior número possível de pessoas. Neste sentido, o Big Mac e o iPhone podem ser considerados Memes, pois são ícones culturais e propagados de pessoa para pessoa.

Apesar de ser um termo oriundo da biologia, o Meme tem sido exaustivamente utilizado como um meio para transmitir mensagens, crenças, valores, doutrinas. E, tão importante quanto isso, tem mostrado seu potencial catalisador da Cocriação. A prática da Cocriação pode ser considerada como “colaboração em um sentido diferente, ou seja, trabalho em conjunto para alcançar algo que os participantes poderiam não atingir por conta própria” (JENKINS, 2014).

Em “Cultura da Conexão”, Jenkins cita diversos exemplos de vídeos que se tornaram virais através da ação criativa do próprio público em modificá-los. Através de repetições, mashups e variações, os usuários recriavam estes vídeos e transformavam-nos em algo que traduzisse sua realidade e, consequentemente, se tornaram mais profundamente incorporados na memória popular.

No caso da fotografia, a prática do Meme é estrondosa. Qualquer acontecimento, seja ele político, social, econômico, vida de celebridades, não interessa! Tudo é motivo para criar um novo Meme. A vítima mais recente do poder “memetizador” da internet, mais especificamente das redes sociais, é o ex-governador do Rio de Janeiro Anthony Garotinho. As fotografias que flagraram a sua transferência do hospital  para o complexo penitenciário de Bangu, na noite de 17 de novembro, tomaram conta da grande rede. Na ocasião, o ex-governador esperneou aos berros dentro da ambulância e teve de ser contido por enfermeiros e bombeiros. A internet não perdoou!

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Meme ironiza a cena protagonizada por Anthony Garotinho ao ser transferido para o presídio de Bangu (Fonte: Diário do Nordeste)

A fotografia surgiu como um retrato do real e, com o passar das décadas, assumiu outros papéis diversos daqueles que a consideravam um reflexo incontestável da verdade. O atual contexto digital em que vivemos aponta uma nova direção para a fotografia: hoje ela é cocriada, multidirecional, maleável. Lucia Santaella, no livro “Comunicação Ubíqua”, afirma que a fotografia é tal qual um vírus, visto que se transmuta ininterruptamente, garantindo sua flexibilidade e perenidade.

A fotografia na era do digital é híbrida, pois permite modificações em sua estrutura, viabilizando a articulação de novas estéticas. Na esteira deste processo, Santaella anuncia a ascensão do Quarto Paradigma da Imagem.

“O quarto paradigma da imagem, na sua natureza eminentemente híbrida, está nos dando a chance de externalizar nossos pensamentos nas intrincadas misturas em que eles se processam na mente” (SANTAELLA, 2013).

A autora aponta o artista como o grande responsável por identificar estas novas possibilidades do uso da imagem. Porém, o próprio público, mesmo que inconscientemente, tem mostrado seu potencial criativo, comunicador, produtor: COCRIADOR. O Meme faz florescer mais um potencial da fotografia, colocando-a em evidência no extenso oceano de conteúdos da internet. A “fotografia memetizada” foi apropriada e hoje serve como um instrumento de significação que acaba se fixando na memória social coletiva. Esta é uma característica notável do mundo em que vivemos, tal como postula Jenkins ao afirmar que “em um mundo em que algo, se não propagado , está morto, se não puder ser citado, pode não significar nada” (JENKINS, 2014). O usuário antenado entendeu o recado e tem se esforçado para se tornar um membro superengajado nesta irresistível cultura da conexão.

Referências:

BENTES, Ivana. A memética e a era da pós-verdade. Disponível em: http://revistacult.uol.com.br/home/2016/10/a-memetica-e-a-era-da-pos-verdade/. Acesso em: 02 dez.2016.
JENKINS, Henry. GREEN, Joshua. FORD, Sam. Cultura da Conexão. Criando valor e significado por meio da mídia propagável. São Paulo: Aleph, 2014.
SANTAELLA, Lucia. Comunicação Ubíqua: repercussões na cultura e na educação. São Paulo: Paulus, 2013.
TEIXEIRA, Jeronimo. O DNA das ideias. Disponível em: http://super.abril.com.br/ciencia/o-dna-das-ideias/. Acesso em: 02 dez.2016.