Literacies

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Arquivo mensal: dezembro 2017

Violência e literacia? Jenkins explica.

É uma bela tarde de sol quando resolvo, por livre e espontânea vontade, tirar do meu bolso um taco de beisebol e distribuir pancada nas três pessoas que caminhavam tranquilamente na calçada ao meu lado. Não demora muito tempo pra que os passantes do local fiquem assustados e comecem a debandar para todos os lados – um deles até veio correndo em minha direção para fugir de mim e outro correu para a rua e foi atropelado. Eis que, depois dessa cena, tiro do mesmo bolso uma AK-47 e vou atirando nos carros desgovernados que começam a transitar por ali. Não satisfeito, quero roubar um deles. Abro a porta de um sedan em movimento, enquanto puxo o motorista para fora e, sem colocar o pé no chão, já me posto dentro do veículo a destruir postes, lixeiras, jardins e caixas de correio. Por diversão, bato o carro a mais de 100km/h contra um ônibus e logo após saio do carro para ter a sensação de como é dirigir um transporte coletivo. De lá vou para o aeroporto, roubo um avião, sobrevoo a cidade, pulo do avião em queda livre até parar no alto de um prédio. Pulo do prédio de 50 andares, estatelo no chão. Morri. Com $50 mais pobre, acordo do lado de fora do hospital e a primeira coisa que faço é dar um soco na senhora que passava por ali. Essa é minha vida.

Quem nunca esteve em situação parecida nesse cotidiano louco em que vivemos, não é mesmo? Tirar uma metralhadora do bolso e fazer piruetas automobilísticas em alta velocidade é tão rotineiro quanto arroz e feijão no almoço, certo? Não? Ué… Será que estamos falando do mesmo universo ou eu estou sonhando? Estamos em San Andreas, no final de 1992, seu nome é CJ e sua próxima missão é perseguir um trem em uma moto, não é? Não de novo? O que é isso, um jogo por acaso?

Elementar, meu caro. Estamos falando de cenas recorrentes no universo de Grand Theft Auto: San Andreas, um dos videogames mais populares da história. Lá, roubar um carro a cada esquina, atirar em pessoas a esmo, pular de prédios e renascer no hospital mais próximo fazem parte do dia a dia, pois é isso que dá vida àquele mundo. Esse modo de ser e essas regras são reais, e dão conformidade ao universo ficcional que representam. Quem joga GTA deve conformar sua lógica ao modo de operar naquele mundo e somente ali essa existência faz sentido.

Por isso, dizer que GTA e demais videogames que simulam experiências de violência transformam adolescentes em assassinos é tão fantasiosa quanto a história do leite com manga. É mito. E como todo mito, dispõe de um embasamento, mesmo que esse background seja falacioso ou baseado em conceitos ultrapassados ou errôneos. E é sobre essa visão conservadora e falha a respeito da representação da violência no entretenimento digital que Henry Jenkins (2006) trata no artigo “The War between Effects and Meanings: rethinking the videogame violence debate” (A guerra entre efeitos e significados: repensando o debate sobre violência nos videogames).

O fato que motivou o autor a escrever o texto foi a decisão do juiz Stephen Limbaugh, em abril de 2002 nos EUA, de considerar que videogames não veiculariam ideias e expressões e, por isso, não gozavam de proteção constitucional. A partir disso, Jenkins argumenta que existem contradições tanto do lado dos conservadores (se jogos não veiculam ideias, como podem influenciar jovens a cometerem atos violentos?) quanto do lado de quem joga (se a comunidade gamer não se responsabiliza pelos atos de outros gamers, como querem proteção constitucional?), pois o debate segue um rumo equivocado.

 

Para resolver essa situação, o autor reorganiza o debate para discutir dois modelos de pensamento opostos que estão ligados, de um lado, a uma visão conservadora e determinista e, de outro, uma visão humanista e educativa. É o que ele chama de “modelo dos efeitos” e “modelo dos significados”.

O modelo dos efeitos

O modelo dos efeitos é compartilhado por psicólogos e pedagogos que seguem uma lógica behaviorista já em descrédito a muito tempo. Nessa versão dos fatos, todo o esforço físico e cognitivo do jogador é deixado de lado para considerar um efeito hipotético como geral para todos os indivíduos. A conclusão desse tipo de pensamento é que a representação de cenas e de experiências de violência nas mídias causaria em todos os usuários os mesmos efeitos, com referência apenas a uma primeira camada de significação, a mais externa e aparente. Assim, roubar lojas em GTA e atropelar pessoas em Carmageddon teria como efeito geral e imutável em todos os jogadores o surgimento do ímpeto de cometer esses mesmos delitos na vida real. Para Jenkins, isso é uma bobagem.

Como professor, ele mesmo diz que um dos grandes desafios de lecionar é que nenhum estudante de uma sala irá compreender suas palavras da maneira que ele gostaria ou acharia mais efetivo. Cada aluno interpreta os signos de uma aula a partir de seu repertório e memória. E o mesmo vale para os videogames.

Então, se quisermos entender melhor como a comunicação funciona e quais são os resultados de experiências midiáticas temos que olhar para essa multitude de significados que emergem de maneira diferente para cada um. É o modelo dos significados proposto por Jenkins.

O modelo dos significados

Por entender que os processos semióticos atingem sua atualização somente a partir do momento que um interlocutor enxerga determinados signos, o modelo dos significados prioriza o esforço cognitivo exercido pelos sujeitos como determinante das características e dos efeitos gerados pelas mensagens veiculadas pelos games. Dessa forma, até mesmo jogos violentos podem, por meio da representação e simulação de situações de brutalidade, suscitar um pensamento crítico com relação a esse contexto. GTA pode ser um game sobre liberdade e consequência, e Battlefield 1942 pode ensinar a seus jogadores como trabalhar em equipe.

Jenkins cita o livro de James Paul Gee (2003) “What videogames have to teach us about learning and literacy” (O que videogames têm a nos ensinar sobre aprendizagem e literacia), no qual o autor demonstra que jogadores são “resolvedores de problemas” ativos, criativos e críticos. Com isso, as ideias e discursos presentes nos videogames serão persuasivas dependendo do background, das experiências prévias e dos valores de cada jogador, e seus objetivos e agendas serão mapeadas dentro do universo ficcional em questão.

Henry Jenkins cita mais alguns autores que partem dessa mesma perspectiva, como Kurt Squire e Talmadge Wright, para demonstrar que games são poderosas ferramentas de aprendizagem e podem veicular complexas mensagens que façam os jogadores pensarem sobre questões sociais e culturais nas quais estão imbricados.

Por fim, Jenkins argumenta que, ao invés de proibir o acesso de jovens a jogos violentos (o que não traria nenhuma resolução ao debate), precisamos alimentar a literacia de games nesses mesmos sujeitos, para que eles fiquem cada vez mais críticos e menos suscetíveis a manipulações sustentadas pelas diversas linguagens em confluência nos videogames. Assim, a violência em jogos pode ser usada para repensarmos as hostilidades que vivemos em nosso cotidiano, gerando reflexões mais aprofundadas sobre o tema.

Referências

GEE, James Paul. What video games have to teach us about learning and literacy. New York: Palgrave/St. Martin’s, 2003.

JENKINS, Henry. The War between Effects and Meanings: rethinking the videogame violence debate. In.: JENKINS, Henry. Fans, Bloggers and Gamers: exploring participatory culture. New York: NYU Press, 2006.

Educação e mídia no II Congresso Internacional sobre Competências Midiáticas

Saber usar as informações presentes nas mídias como garantia de uma atividade cidadã mais plena e democrática é o que trata o conceito de competências midiáticas. Diante do enorme número de informações que somos bombardeados hoje sob diversas linguagens, seja a verbal, sonora ou imagética, o cidadão deve ter cada vez mais domínio das potencialidades discursivas de cada mídia para evitar ser manipulado ou acabar caindo no antro da divulgação de notícias falsas. Além disso, as competências midiáticas asseguram que os usuários participem ativamente da produção de conteúdos para outros, gerando uma rede descentralizada de informações diversificadas, garantindo a democracia. Visando publicizar essas questões, o Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UFJF realizou, nos dias 23 a 25 de outubro, o II Congresso Internacional sobre Competências Midiáticas.

Na programação estava inclusa a conferência “A articulação entre mídia-educadores e educomunicadores como garantia para a superação dos obstáculos à disseminação da educação midiática, no Brasil”, ministrada pelo Prof. Dr. Ismar de Oliveira Soares (Universidade de São Paulo e ABPEducom), sobre o qual falaremos neste post.

No início de sua apresentação, o professor comentou sobre seu projeto de educação midiática que vem realizando em São Paulo com duas escolas da cidade. As realidades das duas instituições são bastante diversas: Dante Alighieri é um colégio particular e de classe média-alta e o Umei Casablanca é uma escola municipal na periferia. Com essa introdução, Ismar quis exemplificar como projetos de educação midiática podem ser implementados dentro de escolas.

“Vou trabalhar aqui a partir disso e mostrar como a área da educomunicaçao parte exatamente do reconhecimento que a criança tem um direito de conhecer o mundo da comunicação e conviver com ele de forma adequada”, relata.

Segundo o professor, existe no Brasil desde 2010 um plano nacional de educação e direitos humanos e cada estado deve produzir seu plano. Em São Paulo, a prefeitura chamou os alunos das duas escolas apresentadas anteriormente para debaterem o plano e mostrarem o que elas gostariam que estivesse lá.

Ainda de acordo com ele, existem na América Latina diversas iniciativas com relação a discutir e implementar questões voltadas para a literacia midiática. Em Cuba, o professor Pablo Ramos trabalha com crianças e adolescentes, entregando câmeras de cinema para elas produzirem filmes e analisá-los, criando um plano de trabalho. Ele ainda pesquisou como na América Latina se desenvolvia essa relação comunicação-educação.

Além disso, congressos em Santiago, Curitiba, Buenos Aires e Las Vertientes (Chile) produziram o material “Educación para la Comunicación – Manual Latinoamericano, produzido pela CENECA em 1992. Esse material mostrava uma convergência de pensamento entre universitários, pesquisadores e a sociedade civil. Segundo o palestrante, esse livro não fala de educomunicação como falamos hoje, mas mostrou que existia na América Latina uma perspectiva acadêmica.

“Quero, com esse foco na América Latina, dizer que aqui foi feito um percurso como foi realizado na Europa e nos EUA. São muitas matrizes de pensamento a respeito da presença da mídia. No caso do nosso continente, não é exatamente a mídia, mas os processos de comunicação, incluindo a mídia, os processos, as atitudes e a gestão de ecossistemas que estão sendo investigados”, comenta.

A partir do apoio da Fapesp o grupo de pesquisa de Ismar realizou um projeto de pesquisa em 12 países da América Latina com o intuito de saber na época como os agentes da relação comunicação/educação imaginavam como se dava essa relação e como eles se colocavam frente a isso. Conforme Ismar relatou, foi um longo questionário, seguido de 25 entrevistas em profundidade entre 1997 e 1999. “Percebemos que grupos que não se conheciam tinham pensamentos e práticas confluentes. Conseguimos identificar os elementos de coincidência e percebemos que as questões delicadas das interfaces e da realidade antropológica se concretizava naquilo que poderia ser um campo emergente. Tomamos ‘educomunicação’ para designar esse elemento”, argumenta.

Ainda segundo Ismar, depois de sistematizado esse campo a partir do conceito central de educomunicação ficou mais fácil dialogar com outros sistemas e áreas do conhecimento. “Fomos chamados para resolver um problema na Prefeitura de São Paulo: a violência dentro das escolas. Não fomos chamados para falar de mídias, nem de currículo, pois nos deram espaço marginal aos sábados. Trabalhamos durante 4 anos com professores, alunos e membros da comunidade a partir do uso da comunicação para o alcance da paz”, diz o professor, que ainda afirmou que entre 2000 e 2017 cerca de 250 mestrados e doutorados versaram sobre o assunto da educomunicação.

Para finalizar, Ismar deixou como assunto os principais desafios para uma maior implementação de práticas de competências midiática tanto em escolas quanto nas diversas relações do indivíduo com as mídias. “Um dos grandes desafios hoje está na Base Nacional Comum Curricular, pois detectei que nos textos havia um imenso espaço de atuação para educomunicação, que se trabalhasse a mídia na educação, principalmente na área de linguagem. Devemos colaborar na base e devemos nos unir para interferir nessa base. Acredito que nossos próximos passos estejam no avanço da perspectiva prática para fazermos a educomunicação acontecer nas escolas e locais próximos a nos”, finaliza.

 

A economia colaborativa é o futuro do mercado?

A obra de Pierre Lévy “A Inteligência coletiva: por uma antropologia do ciberespaço” de 1994 abordava conceitos futuristas para a época, mas que a cada dia vêm se mostrando contemporâneo e em total consonância com as trocas informacionais que vivemos na atualidade.

Lévy dizia que a melhor maneira de ampliar o conhecimento é fazendo interações, intercâmbios, permutas de ideias e aprendizados. Algo semelhante ao que nossos avós já realizavam, quando trocavam receitas, truques e artimanhas para lidar com a cozinha, com a casa e com os filhos. Em maior escala, é assim que se dá o crescimento e o desenvolvimento das sociedades; já atualmente empregando os meios de transmissão de informações – tv, rádio, internet, computador, smartphone – para expandir ainda mais esse universo informacional, criando uma inteligência coletiva que pode ser acessada por todos e a todo momento.

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Assim como a forma de partilhar conhecimento mudou, a forma de se fazer comércio não é mais a mesma. Os e-commerce revolucionaram o mercado por não acarretar custos com transporte e armazenamento de produtos, podendo ser mais baratos e entregues no conforto da sua casa. Ainda sobre as mudanças do mercado, inúmeras lojas surgem e se mantém pelo instagram, assim como lojistas que se aproveitam de plataformas como Facebook ou Youtube para divulgar os produtos.

E, nesse turbilhão de novidades, um mercado que me chama muita atenção são as economias colaborativas. Plataformas gigantes que vêm ganhando o mercado em suas respectivas áreas, como Uber, Airbnb, BláBláBláCar. Assim como plataformas que democratizam o acesso e distribuição de conteúdos, fazendo todos os envolvidos “ganharem”, como Netflix, Spotify, Nubank, entre outros.

 

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Acredito que na nossa sociedade do futuro haverá pouco ou nenhum espaço para empresas ou companhias que prejudiquem uns em detrimento de outros, que os serviços prestados serão justos, com sentimento de ganho ( e também ganho real) por parte de todos os envolvidos!

Isabela Norton

Manual para um jovem YouTuber

Os youtubers são um dos novos fenômenos midiáticos da atualidade e se transformaram em referências para os seus milhares de seguidores ao redor do mundo, sejam na forma de se vestir ou de se comportar. São influenciadores digitais para quem também quer começar a produzir seus próprios vídeos.

Apesar da plataforma YouTube ser um verdadeiro balaio dos mais diversos conteúdos, produções de youtubers brasileiros (e também de outros países) acabam por ter uma estética e forma narrativa bastante similares.

Confira no vídeo abaixo algumas das fórmulas mais usadas:

 

Créditos dos vídeos:

Canais Felipe Neto, Nostalgia, Cellbit, 5inco Minutos, Me Poupe, Rezendeevil