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Fato ou Fake: a resposta do jornalismo para as notícias enganosas

por Aline Pinna

 

Depois de ter sido considerada a palavra do ano de 2017, conforme o site BBC (British Broadcasting Corporation), a expressão fake news (em português significa notícias falsas) continua sendo bastante discutida. Isso porque todos os conteúdos que são publicados na Internet são espalhados de forma muito veloz. Logo, há uma influência muito grande sobre a opinião pública.

Como fala João Vitor Gonzaga (2017), por conta dos efeitos perigosos e daninhos que as notícias falsas causam, as redes sociais decidiram buscar combater os usuários que disseminam as informações enganosas e, também, aquelas pessoas que não fazem por mal, mas acreditam em qualquer conteúdo e acabam propagando as notícias manipuladas.

Por conta da crescente disseminação de conteúdos duvidosos, Gonzaga (2017) cita uma pesquisa divulgada pelo Instituto Reuterns onde fala que nos próximos anos haverá uma ampliação das ferramentas para a análise das informações distorcidas. Hoje, podemos reparar que o jornalismo atual está trabalhando para lutar contra as fake news. Vemos isso com a criação de uma nova editoria: Fato ou Fake.

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Essa nova criação televisiva e online parece que é o resultado que os jornalistas/comunicadores viram para encarar as notícias manipuladas nas suas plataformas, aplicativos e redes digitais. Criada em 30 de julho de 2018, o novo projeto busca esclarecer o que é informação e o que é boato. O objetivo é de alertar o público sobre as notícias falsas propagadas na Internet ou pelo celular.

Para isso ocorrer de forma bem apurada, a editoria é formada por diversos jornalistas da Globo News, TV Globo, G1; jornais Globo, Valor e Extra; Revista Época e Rádio CBN. Essa junção monitora todos os dias as informações suspeitas que são compartilhadas de maneira rápida. Depois dessas checagens feitas pela equipe, os jornalistas divulgam as apurações em seus sites, emissoras e redes.

Outra questão importante dessa nova editoria é que todos os conteúdos que são averiguados pelo grupo jornalístico recebem um “selo”: fato, fake ou não é bem assim. A partir desses selos, as pessoas poderão compreender se a notícia é real, irreal ou se tem algo verdadeiro inserido no conteúdo verificado.

Portanto, percebemos que os novos recursos para combater as notícias falsas estão começando a surgir. O jornalismo teve que se adequar e se aperfeiçoar perante as inúmeras informações que aparecem diariamente. Assim, as técnicas jornalísticas devem ser usadas pelo enunciador, não deixando o furo jornalístico tomar conta, pois a publicação de uma notícia errada pode ser fatal.

 

Referências:

FAKE NEWS É ELEITA A PALAVRA DO ANO. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/internacional-41843695>. Acesso em: 25 de novembro de 2018.

GONZAGA, João Vitor de Lacerda. Uma análise das redes sociais na política brasileira. 2017. (Artigo de conclusão do curso Ciências Humanas, da Universidade Federal de Juiz de Fora, UFJF, 2017).

VÍDEOS G1 FATO OU FAKE. Disponível em: <https://g1.globo.com/fato-ou-fake/playlist/videos-g1-fato-ou-fake.ghtml>. Acesso em: 14 de dezembro de 2018.

Suicídio: precisamos de habilidades críticas para falarmos sobre

por Matheus Bertolini

O paradigma do silêncio ainda está associado à temática do suicídio. A mídia não noticia e as pessoas não são culturalmente educadas a dialogarem sobre a morte autoprovocada. O estereótipo e o preconceito que sustentam a temática distanciam a vítima e os sobreviventes de uma possível reinserção social e de uma assistência digna na valorização de sua vida.

Pouco se sabe sobre a temática, e menos ainda sobre a forma correta de tal abordagem. A máxima atual defendida pelo CVV – Centro de Valorização da Vida, é que “Precisamos falar sobre”. A ambiguidade da frase nos coloca em uma reflexão necessária de que as vítimas precisam de espaços confortáveis para o diálogo e, portanto, é crucial a escuta crítica de um par. Além disso, outro sentido está na importância de tirarmos o peso de tabu sobre a temática, a partir do momento que naturalizamos o feito e evidenciamos que todos estão propícios e que há um caminho alternativo no rompimento desse sofrimento.

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O criticismo para a contextualização do suicídio inicia-se, como já dito, na escuta crítica de um par. Isso significa a disponibilidade de escuta e auxílio que algum par (amigo, familiar, professor, ou outra pessoa que complete a confiança da vítima) oferece ao colocar-se a disposição da divisão daquele mal. Escutar criticamente o sofrimento do outro, é ouvir um grito por ajuda que muitas vezes é silencioso, é dispor-se a conhecer o próximo e a ti mesmo, é encontrar cura para alguém que já desistiu de viver.

Falar corretamente sobre o suicídio é outra tarefa que está emergindo na era digital. Os espaços conectados dão luz para uma contextualização embebida de sombras. Os tabus e estereótipos estão em uma linha tênue da propagação indevida e da possibilidade do rompimento de tais rótulos. Nessa ótica, é necessário que saibamos diferenciar o que é correto ou não nesses produtos que estão tomando conta de espaços digitais. A literacia midiática surge como a habilidade capaz de acender uma compreensão correta e ética diante a temática, promovendo mais conteúdos que valorizem a vida e não ajam no sentido reverso, ou seja, um gatilho.

Por fim, a construção desse criticismo não é fácil, de tal forma que inicia-se esse processo na educação e permeia-se por diferentes níveis culturais, sociais, psicológicos, tecnológicos, entre outros, que convergem o conhecimento, lastro e vivência desses prosumidores que tornam-se capazes de consumirem conteúdo de qualidade e, simultaneamente, interpretarem, produzirem e propagarem, materiais que não são nocivos e tóxicos, mas assumem em sua estruturação uma preocupação de ensino que vai para um aprendizado extra escolar, e assim, promovem a valorização da vida, o amparo aos sobreviventes e a instrução para que mais pessoas possam ouvir, ler e falar criticamente sobre a temática.

 

O tribunal virtual do Facebook e do Whatsapp e o efeito do “linchamento virtual”

daniel de oliveira

 

Muito antes das redes sociais infectarem mundo afora, boatos e meias verdades já circulavam por aí, fazendo vítimas e destruindo vidas inocentes. Quem não se lembra do exemplo da Escola Base, um terrível episódio na história da imprensa brasileira, que destroçou pessoas inofensivas, em detrimento de boatos e más apurações. Agora imagine isso no mundo virtual, em que uma voz é elevada a décima potência e se faz ouvir a longas distâncias.

Tomemos como exemplo a obra cinematográfica da diretora Carolina Jabor (foto acima), “Aos Teus Olhos” (2018). Como ferramentas de comunicação que levam informações às pessoas, mas também geram boatos e fake news, o Whatsapp e o Facebook podem induzir pessoas a cometerem injustiças, atropelar direitos e potencializar vozes, trazendo muitas vezes consequências catastróficas para certos indivíduos. Este é o segundo longa-metragem de ficção de Jabor, que explora a barbárie humana estimulada pelas redes sociais, revelando o lado primitivo de muitas pessoas, chegando até mesmo ao linchamento virtual.

Da mesma forma que o caso Escola Base fez ao julgar e condenar sem evidências reais e concretas os protagonistas, o mesmo ocorre no filme da diretora, em que um professor de natação é acusado de dar um beijo na boca de uma criança, entretanto, sem provas efetivas. Partindo deste princípio, a narrativa se desenvolve a uma série de acusações e consequências que afetam não só a vida do professor, mas também da escola de natação em si e de terceiros. As redes sociais são o estopim para agressões (físicas e morais) e condenações, levando a situações hostis ao protagonista da história.

Longe de debater a inocência ou culpabilidade do professor, o filme de Jabor propõem uma reflexão acerca do valor da Literacia Midiática dentro das redes sociais, e em como a mesma pode reduzir casos de propagação de mentiras e falsas acusações, além de incentivar um melhor uso do espaço virtual e consequentemente melhorar as relações lá existentes.

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Nos dias atuais, infelizmente, temos casos de injúria e difamação virtual que levaram a mortes de pessoas inocentes. Um deles foi o linchamento da dona de casa Fabiane Maria de Jesus, em 2014. A vítima foi confundida com uma suposta criminosa que sequestrava crianças para realizar rituais de magia negra, tudo isso por conta de um retrato falado publicado em um post no Facebook de um site notícias do Guarujá (SP). Mas a história não passava de um boato que não foi devidamente apurado.

O linchamento virtual é algo que ocorre nas redes sociais, podendo inclusive mudar a política de um país, como podemos notar pelas fake news nas campanhas eleitorais dos Estados Unidos (2016) e do Brasil (2018). Além disso, é capaz de atrapalhar o livre exercício da profissão de jornalistas que apuram corretamente as informações. Em 2018, 137 profissionais da comunicação foram vítimas de alguma forma de agressão no país.

Referências:

CARVALHO, André; COELHO, Krisllen Mayra; CARNEIRO, Leonardo Ramon; ROCHA, Sarah Maria; BRITO, Rosaly de Seixas. Discurso de ódio nas redes dgitais e a instauração do “tribunal virtual”. In: Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação – Intercom.            Joinville,       2018.  Disponível                               em                          < http://portalintercom.org.br/anais/nacional2018/resumos/R13-0883-1.pdf>.

MARTINUZZO, José Antônio; BASTOS, Marcela Tessarolo. Boatos em rede social no contexto da sociedade midiatizada. Revista ALCEU – v. 18 – n.35 – p. 5 a 20 – jul./dez. 2017. Disponível em < http://revistaalceu.com.puc-rio.br/media/A01_p5-20.pdf>.

SANTOS, Marco Aurélio Moura dos; CUNHA, Renata Silva. Violência Simbólica nas Redes Sociais: incitação à violência coletiva (linchamento). In: VII CONGRESSO BRASILEIRO DA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO – REGULAÇÃO DA MÍDIA NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO.           São            Paulo,            2014.           Disponível           em            < http://www.revistaseletronicas.fmu.br/index.php/CBSI/article/view/526/639>.

SOUZA, Balduíno; ALTOÉ, Giovanni. O Whatsapp como Ferramenta de Transformação das Interações Sociais. In: Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação – XVIII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Centro-Oeste – Goiânia, 2016. Disponível em < http://portalintercom.org.br/anais/centrooeste2016/resumos/R51-0863-1.pdf>.

https://www.bbc.com/portuguese/brasil-46177957.

 

O arquivo, esse monstro temível e sedutor, é transparente e opaco

por Ramsés Albertoni

 

A artista plástica chilena Voluspa Jarpa possui uma obra que se caracteriza por refletir a respeito do problema do deslocamento dinâmico da cidade, a insegurança, o abandono a destruição, a história e a memória, incorporando as tecnologias digitais como ferramentas representacionais em seus trabalhos. Jarpa questiona as representações da história em diversos sistemas da imagem, como nos meios de comunicação ou na arte.

 

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Foto: Ramsés Albertoni

A instalação da artista, Histórias de aprendizagem, participou da 31ª Bienal de Artes de São Paulo, que ocorreu em 2014. Os trabalhos da edição desta Bienal, intitulada Como (…) coisas que não existem, foram concebidos dentro do conceito de “projeto curatorial”, muitos realizados em colaboração entre dois ou mais indivíduos: artistas e profissionais de outras disciplinas, como pedagogos, sociólogos, arquitetos ou escritores. Firmou-se como uma exposição profundamente conectada com alguns temas centrais da vida contemporânea: identidade, sexualidade e transcendência.

A obra de Jarpa é uma instalação labiríntica e irregular composta, de um lado, por arquivos da CIA sobre a ditadura brasileira (1964-1985) revelados há alguns anos pelo governo dos Estados Unidos e, de outro, por documentos dos serviços secretos brasileiros produzidos durante os mandatos dos presidentes Getúlio Vargas (1951-1954) e João Goulart (1961-1964). Deste último, ela inclui também registros sobre o exílio no Uruguai e o suposto assassinato na Argentina, em 1976, investigado como parte do plano coordenado entre as ditaduras do Cone Sul conhecido como Operação Condor.

De acordo com a artista, é sintomático o fato de que, antes da liberação desses documentos ao acesso público, em todos eles haja trechos que foram riscados. Isso pode ser interpretado como o comportamento histérico que, na psicanálise freudiana, designa a impossibilidade de lidar com o trauma, pois o trauma é um relato arquivado e negado, e o sintoma, um arquivo cifrado. Aos riscos dos documentos originais, a artista soma a estrutura da instalação, que impede que o espectador tenha acesso aos documentos que estão diante dele, podendo apenas vislumbrar os que estão em segundo e terceiro planos. Dessa maneira, experimenta-se uma possibilidade como impossibilidade, o que remete a uma promessa de revelação que, na verdade, se concretiza como repressão.

Jarpa realizou várias obras a partir de arquivos sobre o Chile e outros países latino-americanos revelados pelos Estados Unidos. Em todos os casos, analisa o que foi apagado e chama a atenção para a imagem resultante do documento que sofreu intervenção: uma imagem que expressa tanto a construção de visibilidades quanto a potência poética e política dos usos do arquivo, e que cria sombras no presente.

Dessa forma, o artigo reflete a comunicação humana como um processo artificial em que os símbolos se organizam em códigos, como formula Flusser (2007), que tecem “o véu do mundo codificado, o véu da arte, da ciência, da filosofia e da religião, ao redor de nós, e o tece com pontos cada vez mais apertados, para que esqueçamos nossa própria solidão e nossa morte, e também a morte daqueles que amamos”. O “mundo codificado” seria, então, aquele cujo significado geral da vida em si mudou sob o impacto da revolução na comunicação.

Por conseguinte, a questão a ser investigada é o que há por detrás das imagens criadas por Jarpa, numa sociedade em que a transparência é uma norma cultural, segundo o filósofo Byung Chul Han, cujos ditames impõem um sistema totalitário que suprime a alteridade, operando a “violência da positividade” em desfavor da “negatividade”.

O futuro não será digital

por Ramsés Albertoni

 

Vários pesquisadores na área de Inteligência Artificial pontuam que muitas das inovações tecnológicas já são realidade, pois todas as coisas estão conectadas sem bordas, objetos, máquinas e/ou artefatos, e já começaram a interagir de maneira inteligente, o que está gerando ações inteligentes responsivas ao comportamento humano. Dessa forma, o atual estágio de conexão proporcionado pelas novas tecnologias é considerado por alguns estudiosos como a quarta Revolução Industrial e a segunda Revolução da Internet, sendo que atualmente existem três camadas sobrepostas, quais sejam, a conectividade social, a conectividade híbrida e a arquiconectividade, conforme Lúcia Santaellla.

 

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A conectividade social se relaciona à nova fase das chamadas mídias sociais, porquanto findou a euforia celebratória da Web 2.0, pretensamente democratizante, aberta à participação e ao compartilhamento de todos com todos, haja vista que os oceanos de dados e rastros dos indivíduos são manipulados por poderosos algoritmos e por um monitoramento total. A conectividade social, responsável por uma personalização extrema dos dados, gera as chamadas “câmaras de eco” ou “salas espelhadas”, em que tudo o que as pessoas veem e consomem são reflexo de si próprias, cuja consequência são as bolhas filtradas, as fake news e a pós-verdade, o que as torna mais vulneráveis a propagandas e manipulações. Dessa forma, deve haver uma formação educacional, uma literacia midiática, que habilite o indivíduo a colocar suas visões de mundo à prova.

A conectividade híbrida se refere à robótica e à conexão com o corpo humano, pois com os algoritmos evolutivos, os robôs são capazes de aprender à maneira de um organismo vivo dotado de inteligência; consequentemente, com a fusão do biológico-digital-físico são desenvolvidos os mais diversos dispositivos que permitem sua aplicação em diferentes áreas do saber.

A arquiconectividade, cuja camada comporta a internet das coisas, a realidade aumentada e as tecnologias portáteis, vestíveis e implantáveis, permite ambientes de computação em redes globais e ambientes imersíveis invisíveis, em um tecido de informação de abrangência mundial.

É preciso considerar, portanto, que a AI provoca uma ruptura naquilo que se concebe como sendo o humano, pois ela possibilita que máquinas aprendam com as experiências, se ajustem a novas entradas de dados e performem tarefas como seres humanos, pois se configuram a partir da deep learning e do processamento de linguagem natural. Com essas tecnologias, os computadores podem ser treinados para cumprir tarefas específicas ao processar grandes quantidades de dados e reconhecer padrões nesses dados.

Porém, deve-se ressaltar que Pierre Lévy pondera que não acredita na AI, pois no que se refere ao ser humano, toda inteligência é artificial, “salvo se dissermos que a inteligência humana é artificial desde o começo, pois, no fundo, a escrita já é inteligência artificial; já é a memória sobre o papel ou numa biblioteca. O que é isso? É a memória exterior ao organismo humano; sim, pois a memória é uma parte muito importante da cognição humana”.

Entretanto, Santaella pondera que essas transformações não se dão de modo homogêneo, uma vez que as diferenças sociais e históricas são abissais entre os países, e que os limiares tecnológicos apresentados descrevem o estado em que se encontra hoje a evolução do homo sapiens sapiens. Neste ponto, Santaella se aproxima da questão do “viés sistêmico”, apontado por Henri Jenkins, em Cultura da Conexão, ou seja, o modo como a criação/consumo de conteúdo é restrito e desequilibrado por características demográficas dos participantes/não-participantes, pois os recursos tecnológicos não superam outros fatores que dão forma ao acesso relativo de grupos diferentes ao poder comunicativo e cultural. Assim, a não-participação pode persistir quando se tem acesso técnico, mas não as habilidades e o conhecimento cultural exigidos para se participar plenamente do universo arquiconectado.

Quem fornece o que, para quem, a que preço?

por Matheus Bertolini

O pensamento ecossistêmico diante a comunicação reconfigurou a perspectiva das relações estabelecidas entre o meio, mensagem e sujeito. Nessa ótica, o pressuposto emerge a partir do conjunto interativo síncrono entre a habitação de seres vivos e não vivos que se expandem nessas conexões, movimentações, fluxos e etc. Portanto, vale-nos a ressalva, que agora, portanto, esses seres abióticos – tecnológicos, algorítmicos, de design e interfaces responsivos; adquirem uma interferência na fruição e percurso desse usuário.

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O texto de José Van Dijck¹ contextualiza e norteia uma reflexão para a localização do papel dos algoritmos na direção dos desejos,  o poder dos usuários para controlar seus dados, a tensão aparente entre as comunidades, a comercialização da conectividade e o significado de “público” e “sem fins lucrativos” em uma ecologia dominada por forças corporativas.

A mineração de dados, por meio das métricas, cria uma captura para as tendências em tempo real. E por meio dessas hipóteses híbridas e suas reverberações, os dados desse sujeito tornam-se valiosos para o ambiente digital. Afinal os usuários precisam de plataformas para expressarem suas opiniões e expressões criativas, enquanto as plataformas precisam que os usuários canalizem suas expressões em formatos pré-definidos na construção das mesmas e dos seus bancos de dados.

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Dessa forma, existem duas visões diante esses consumidores, a primeira considera-os agentes no processo de produção, “livres” para abandonarem as plataformas e o fornecimento de dados. Por outro lado, são consumidores que não compreendem a lógica operacional, econômica e social que arquiteta o trancamento da sociabilidade estabelecida entre a linha tênue de público e privado.

De acordo com a autora, no ecossistema emergente, a palavra “livre” assume: conteúdos gerados gratuitamente pelos usuários, distribuição gratuita por plataformas e não contaminados pela mídia, comércio e interesses do governo. Porém a mesma palavra assume um valor antagônico, de “pago”. Não em dinheiro, mas na atenção dos usuários, bem como em sua criação e dados comportamentais.

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E, portanto, os conteúdos não possuem mais valor em si mesmo, ou seja, torna-se uma combinação de conteúdos (em sua essência, produção e criação), metadados (valores abióticos como já mencionado anteriormente) e dados comportamentais e de perfis (a inserção do sujeito e suas características cognitivas no espectro artificial digital) que tornam recursos conectivos interessantes para a construção desse fluxo hiperconectado.

Por fim, a pergunta que intitula esse pensamento está longe de ser respondida. Afinal, a retroalimentação entre consumo e consumidor é uma característica onipresente na cultura digital. Cabe-nos competências e habilidades para discernirmos criticamente os lugares que inserimo-nos e as consequências dessa imersão conectiva.

¹VAN DIJCK, José. The culture of connectivity: A critical history of social media. Oxford University Press, 2013.

A Literacia nas obas de arte

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Como já vimos em postagens anteriores, a literacia midiática é um termo aplicado ao estudo da interpretação textual, ideologia e audiência propagados pela mídia (jornal, TV, rádio, internet). A literacia constrói significados a partir de experiências e contextos (político, econômico, social, cultural), numa tentativa de estabelecer uma autonomia crítica em relação a estes veículos de comunicação.

Estas habilidades entretanto, estão sempre em constante evolução, pois é um processo no qual o objetivo é a pessoa conseguir acessar as informações dos meios, entender as mensagens contidas nestas informações, pensar por conta própria sobre estas informações e fazer escolhas com base nestas informações. Isto faz com que tomemos decisões baseadas em pensamento crítico e proporciona uma cidadania mais ativa.

De entre as várias competências que um cidadão literato a nível midiático deve ter, destaca-se a capacidade para avaliar a confiabilidade da informação que recebe, principalmente quando a informação vem do ambiente digital. Não apenas informações, notícias, textos e imagens, mas para uma cidadania participativa e um maior entendimento do mundo ao redor, é necessário que o cidadão também tenha a capacidade de comunicar e interpretar significados usando as linguagens das disciplinas artísticas, ou seja, que ele tenha uma literacia artística.

A literacia artística “implica a aquisição de competências e uso de sinais e símbolos particulares, distintos em cada arte, para percepcionar e converter mensagens e significados. Requer ainda o entendimento de uma obra de arte no contexto social e cultural que a envolve e o reconhecimento das suas funções nele” (GRANDÍSSIMO, Maria Alice Sousa Dias; CAETANO, Ana Paula Viana, 2010, p.69).

Para as autoras, a literacia em artes ocorre através do uso de capacidades e desenvolvimento de competências, em que o saber não é compartimentado, ele autentica-se sempre que somos capazes de “(re)definir e inserir noutros contextos”. Nesta perspectiva, e de acordo com o artigo defendido por elas, “desenvolver a literacia artística é um processo sempre inacabado de aprendizagem e participação, o que contribui para o desenvolvimento das nossas comunidades e culturas, num mundo onde o domínio de literacias múltiplas é cada vez mais importante” (GRANDÍSSIMO, Maria Alice Sousa Dias; CAETANO, Ana Paula Viana, 2010, p.69).

A literacia pode ser entendida como uma leitura da vida, a capacidade que os humanos têm para (re) ler e (re) escrever o próprio mundo e de (re)criar (re)significações. Esta característica, seria portanto, a liberdade.

Pedro de Andrade em seu artigo, faz uma abordagem de sobre as principais regiões sociais de aprendizagem dos saberes e da cidadania, os locais de consumo de cultura, lazer, jogo, entretenimento e informação. Para o autor, estes lugares são como novos territórios de formação informal ao longo da vida. “Numa dessas arenas – o museu de arte – a formação informal permite, por exemplo, a construção da literacia artística, que consiste no processo de comunicação estruturado pela leitura e escrita próprias das actividades artísticas, especificamente no seio da produção da obra de arte, através da sua mediação pelo museu, e no seu consumo. Na modernidade avançada/pós-modernidade, surge ainda a inédita ‘literacia multicultural e híbrida’. Tais figurações de literacia, em articulação com as opiniões públicas local, nacional e global, contribuem para o investimento recente na cidadania cultural por parte do habitante da urbe, em especial no quadro das ‘cidades criativas’” (ANDRADE, Pedro de, 2008, p.51).

Andrade opina que os museus devem ser considerados ‘instituições de comunicação’, onde se nota uma mudança nos tipos de apresentação das obras ao público. Os visitantes dos museus, segundo o autor, devem ser entendidos como utilizadores ativos, embora os modos de interatividade se mostrem um tanto diversos, conforme os tipos de museus analisados, seja científico, técnico, artístico ou outro.

O texto ainda aborda a conexão entre os museus e a formação informal, uma relação notável entre a museologia e a comunicação, redefinindo o espaço do museu enquanto espaço cultural e lúdico dirigido a segmentos de público tendencialmente diferenciados. “No campo da cultura e das artes, de que nos ocuparemos neste texto, o ‘analfabetismo artístico’ surge como a incapacidade, total ou parcial, de entender e registar a linguagem da arte. Por sua vez, a ‘iliteracia digital’ reside na desqualificação crónica relativamente à leitura e à escrita da informação e da cultura veiculada” (ANDRADE, Pedro de, 2008, p.53).

Por isso a importância para, “no campo artístico, tais políticas deverão suscitar um melhor conhecimento das artes, para que possa emergir uma cidadania artística mais consciente e mais informada” (ANDRADE, Pedro de, 2008), a fim de compreender melhor obras artísticas que se relacionam com a mídia. Um exemplo que ilustra bem é o filme “Com amor Van Gogh” (2017), considerado a primeira animação do mundo feita totalmente com pinturas. Com tinta a óleo sobre a tela, a história se desenrola em traços muito similares aos de Van Gogh, por meio do trabalho de pintores que reproduzem a técnica do artista holandês. Todos os mais de 65 mil frames foram pintados à mão por uma equipe de 125 artistas. Já disponível na Netflix, o longa de animação narra a história do carteiro Armand Roulin que encontra uma carta de Van Gogh destinada ao irmão, Theo. Armand decide então ir até Arles entregar a carta aos familiares do artista.

Outro exemplo bem conhecido é a influência de obras de arte em obras cinematográficas. É inegável que a pintura é transplantada ao cinema por meio de referências e dedicatórias. Um canal no Vimeo (Film Meets Art) se dedica a fazer esta incrível compilação.

Portanto, a literacia artística pode ser definida como capacidade de reconhecer, compreender e exprimir corretamente uma obra em qualquer meio de expressão visual.

 

ANDRADE, Pedro de. Cidadania cultural e literacia artística: lazeres e saberes em museus e cibermuseus da cidade criativa. In: Comunicação e Sociedade, vol. 14, 2008, pp. 51-59

CRARY, J. Suspensões da percepção: atenção, espetáculo e cultura moderna. São Paulo: Cosac Naify, 2013.

GRANDÍSSIMO, Maria Alice Sousa Dias; CAETANO, Ana Paula Viana. A Obra de Arte como um caminho para uma Literacia Artística no Currículo de EVT. 2010,

 

A arqueologia das mídias

Em seus capítulos 11 e 12 do livro “Temas e dilemas do pós digital” (SANTAELLA, 2016), Lucia Santaella relata que, atualmente, há atenção ao arquivo por várias razões. Uma delas, segundo ela, é a arqueologia das mídias. Para discorrer sobre o tema da arqueologia, a autora recorre a alguns pensadores, como: Sigmund Freud; Walter Benjamin e Michel Foucault. Para ela, a arqueologia se trata de um método aberto, por haver distinções conceituais e metodológicas entre pensadores. Para isso, ela debate acerca da definição de “arquivo” apresentada pelos autores supracitados.

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De acordo com Santaella, Freud pensava no trabalho do arqueólogo como uma analogia para o funcionamento do inconsciente, sendo que o analista deveria desempenhar uma tarefa similar. Assim como o arqueólogo, o psicanalista se debruça sobre restos, resíduos, fragmentos. “Foi Freud quem, com inusitada força, mostrou que os caminhos pelos quais aparece o incondicional do sujeito não são os assignados ao discurso de um logos seguro da sua própria presença e voz, mas aquelas fendas que percorrem o corpo, as emergências a meia voz, os documentos de arquivo que se revelam com efeito de retardo e sem possibilidade de domesticação calculadora” (FASOLINO, 2014). Freud, portanto, baseava o seu trabalho na desconstrução do que era dito e demonstrado por seus pacientes.

Em uma perspectiva similar à freudiana, Benjamin também compara a arqueologia à historiografia. Para ele, a história é descontínua, não sendo, portanto, linear. De acordo com o pensador, a historiografia é burguesa e social democrata, sendo ela baseada na crença no progresso, sustentada em um pensamento capitalista. Dessa forma, ela é um documento de barbárie, uma vez que os povos dominantes exercem violência sobre a cultura dominada.

O pensador se compara à Freud, porque para ele, a história pode servir como metáfora para um tempo repleto de agoras, por meio dos quais o presente conversa com diversos passados.. Nesse sentido, ele defende uma visão plural sobre a história, sendo ela repleta de fragmentos.

“A verdadeira imagem do passado perpassa, veloz. O passado se deixa fixar, como imagem que relampeja irreversivelmente no instante de sua cognoscibilidade. Articular historicamente o passado não significa conhecê-lo “como ele de fato foi”. Significa apropriar-se de uma reminiscência, tal como ela relampeja no momento de um perigo (BENJAMIN, 1973, p.80).

Benjamin e Freud abordam, portanto, a história enquanto um acúmulo de fragmentos, sendo necessário desvendá-los, ou seja, buscar o que ficou esquecido.

“Quem pretende aproximar-se do próprio passado soterrado deve agir como homem que escava. Antes de tudo, não deve temer voltar sempre ao mesmo fato, espalhá-lo como se espalha a terra, resolvê-lo como se resolve o solo. Pois fatos nada são além de camadas que apenas à exploração mais cuidadosa entregam aquilo que recompensa a escavação” (BENJAMIN, 1987, p. 239).

Foucault aborda, em seu livro A “Arqueologia do Saber” (1972), a arqueologia enquanto método. Esta, por sua vez, procura estudar as estratégias de organização dos saberes por meio de formações discursivas. É importante entender, entretanto, que essas formações nascem a partir de uma série de relações estabelecidas por processos econômicos e sociais, instituições, sistemas de normas, formas de comportamento, técnicas, modos de caracterização e tipos de classificação. É papel dessa arqueologia, dessa forma, desvendar tais jogos responsáveis por formular um determinado discurso.

Segundo Foucault, essas formações discursivas são constituídas por arquivos. O arquivo, para o pensador, é a lei do que pode ou não pode ser dito. Trata-se, portanto, de um sistema de formações discursivas, responsável por selecionar aquilo que vai ser conectado à história e aquilo que será excluído. Para Foucault, o arquivo define aquilo que merece ser memorizado e esquecido. A arqueologia, nesse sentido, procura estudar esse arquivo, desconstruindo essas formações discursivas, essas pequenas partes, já que é impossível recuperar o arquivo em sua totalidade.

Nesse sentido, é possível traçar uma similaridade entre Freud, Benjamin e Foucault, já que eles abordam a desconstrução enquanto alternativas para o acesso ao arquivo, à essa bacia semântica.

Referências:

BENJAMIN, Walter. “Tesis de filosofía de la historia”, in: Discursos interrumpidos I, Jesús Aguirre (trad.). Madrid: Taurus, 1973, pp. 175-192.

_____. Obras escolhidas II. Rua de mão única, Rubens R. Torres Filho e José Carlos M. Barbosa (trads). São Paulo: Brasiliense, 1987.

FASOLINO, Ruben. Derrida, Freud e o retorno do arquivo. Natal, 2014. Rev. Princípios, v.21, n.35, p. 63-83.

FOUCAULT, Michel. A arqueologia do saber, Luiz Felipe Baeta (trad.). Petrópolis: Vozes, 1972.

SANTAELLA, Lucia. Temas e dilemas do pós-digital: a voz da política. São Paulo: Paulus, 2016.

 

Da introdução do jornalismo na Web à recirculação das notícias nas redes sociais

por Aline Pinna

 

Em 2002, os serviços de redes sociais ainda não eram existentes. Assim, foi através dos blogs que ocorriam as primeiras experiências em webjornalismo participativo/colaborativo. Com o passar dos anos, houve a evolução da informática que possibilitou a criação de condições para a emergência de aplicações das técnicas de computação distribuída. Além disso, surgiu o recurso de inteligência artificial ao jornalismo.

Variadas ferramentas e recursos foram instalados no dia-a-dia dos indivíduos. Os jornalistas também tiveram que se adaptar a modernidade. O ritmo de trabalho passou a ser ditado pela tecnologia e o repórter teve que acompanhar a velocidade do sistema, o que incluiu a diminuição dos contatos interpessoais com as fontes e com seus colegas. Assim, o resultado foi a precarização do trabalho nas redações e uma preocupação ainda maior com a transparência nos textos noticiosos e com a sua objetividade. Apesar dessas novidades, o repórter ainda é visto como um importante defensor da democracia, antagonista do Estado e dos poderes constituídos.

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As tecnologias de interação intercedida pelo computador, mídias locativas, análise de bases de dados e narrativa hipertextual assumiram o primeiro plano na atividade jornalística. Frequentemente as notícias passaram a ser produzidas em termos de sua utilidade para a distribuição em smartphones, notebooks e tablets. Deste modo, a computação, cada vez mais, é inserida como base das rotinas produtivas na imprensa, em lugar do significado político e social dos acontecimentos.

Nos últimos anos, a mídia tem buscado, constantemente, explorar a inteligência coletiva disponíveis nas redes telemáticas. Outra questão importante nesse setor é o uso da inteligência artificial na apuração e redação de notícias. De acordo com Träsel (2013, p. 203), adotando-se a inteligência artificial evita a “irrupção da criatividade, da indignação, da empatia, da contradição, enfim, da política no cotidiano ordeiro das redações de hoje em dia”. Logo, as matérias são produzidas instantaneamente e sem equívocos factuais, embora, talvez, sem aquele sabor literário que o jornalista introduz no decorrer do texto.

A partir dessas informações, hoje, encontra-se uma nova forma de distribuição das notícias. Com a estrutura descentralizada das redes sociais, compreende-se que há uma nova maneira de uso das redes graças aos seus interagentes. Estes podem filtrar e comentar as notícias e contribuir para o processo jornalístico. Podemos ter como exemplo o Twitter. Este site de rede social é uma plataforma onde os usuários podem postar atualizações de até 140 caracteres. Além disso, ele também pode ser visto como uma ferramenta para compartilhamento e troca de informações. Segundo Zago (2013, p. 213), “o Twitter poderia ser considerado mais um espaço para o compartilhamento de informações do que propriamente uma rede social”. Nota-se, então, um caráter de site no qual ele pode ser apropriado por seus usuários para o jornalismo.

Percebemos isso no momento em que o Twitter modificou uma questão importante na sua tela inicial. Antigamente, a sua pergunta inicial era “O que você está fazendo?”. Nos últimos anos, mudou-se para “O que está acontecendo?”. Tem-se essa alteração por conta de sua apropriação para a circulação de conteúdos.

Do mesmo modo com que os meios de comunicação se apreendem desses ambientes para distribuir notícias, os interagentes também podem usar sites de redes sociais para comentar (expressar opinião, reagir com humor a determinadas situações jornalísticas, criticar) e filtrar (publicar pequenas notas, inserir links ou manchetes) notícias, vindo a contribuir para a recirculação desses conteúdos jornalísticos.

Conforme Zago (2013), o jornalismo pode ser compreendido como um procedimento constituído em quatro fases: apuração, produção, circulação e consumo. Essas etapas, muitas vezes, se sobrepõem e se complementam, ou seja, uma caminha lado a lado da outra. Porém, Zago (2013) ainda comenta que o processo final não termina no consumo. Ele pode continuar com o acontecimento sendo novamente posto em circulação pelas mãos dos interagentes, que filtram e comentam as notícias originalmente postas em circulação pelos veículos. Essa fase é nomeada de recirculação na medida em que a etapa de circulação pode continuar, através de espaços públicos mediados após o consumo.

Com essa nova fase, não caracteriza que antes a informação não recirculava após o consumo. As informações recirculavam, mas de forma “manual”, isto é, o famoso boca-a-boca. Essa “nova” recirculação diz respeito ao fato de que nos espaços públicos mediados, como o Twitter, é mais fácil e prático de se comentar e filtrar conteúdos, por conta da velocidade incontrolável que as notícias são compartilhadas.

Tendo em vista essas características, Zago (2013, p. 215) cita Correia (2010, p. 7) no momento em que ele argumenta que a principal modificação do sistema de circulação jornalístico em redes virtuais seria o fato de que esses ambientes “constituem novos fluxos de informações onde emissão, recepção e resposta á emissão acontecem pelo mesmo ‘canal’, pelo mesmo meio”.

Portanto, apesar de seus aspectos de site de rede social, pode-se entender que o Twitter é de fato mais um meio comunicacional do que propriamente uma rede social, onde alia informação com interação e/ou interatividade, conteúdos (notícias) com comentários, veículos com interagentes e temas triviais com acontecimentos jornalísticos.

 

Referências:

TRÄSEL, Marcelo. Toda resistência é fútil: o jornalismo, da inteligência coletiva à inteligência artificial. p. 191-210. In: PRIMO, Alex (organizador). Interações em rede. Porto Alegre: Sulina, 2013. (Coleção Cibercultura)

ZAGO, Gabriela da Silva. Da circulação à recirculação jornalística: filtro e comentário de notícias por interagentes no Twitter. p. 211-232. In: PRIMO, Alex (organizador). Interações em rede. Porto Alegre: Sulina, 2013. (Coleção Cibercultura)

Ciberespaço, cultura participativa e memória

Por: Isabella Gonçalves

Ao estudar o imaginário e a memória, é possível traçar uma relação entre eles. Ambos não são estáticos, sendo, portanto, construídos e subjetivos. Dessa forma, podem sofrer transformações ao longo do tempo, influenciados pelo contexto social. Tratam-se, nesse sentido, de “bacias semânticas”, “espíritos do tempo”, “obras abertas”, que se transformam a partir da influência das instituições sociais e de indivíduos. Em seu livro publicado em 2003, Juremir Machado da Silva discorre acerca das Tecnologias do Imaginário, definindo-as como dispositivos (Foucault) de “intervenção, formatação, inferência e construção das “bacias semânticas” que determinarão a complexidade (Morin) dos trajetos antropológicos de indivíduos ou grupos” (SILVA, 2003, p.20).

O pesquisador define as diferentes tecnologias como tecnologias do imaginário, por serem elas as responsáveis por atuarem na construção do imaginário social. Pensando sobre isso, é possível refletir, então, acerca da incipiência do conceito “tecnologias da memória”, já que a partir da primeira delas, a escrita cuneiforme, a relação social do homem com a memória se transformou profundamente. Naquela época, os sumérios utilizavam a escrita para arquivar informações matemáticas do governo, tomando cuidado, desde então, para o seu armazenamento.

Em contraste, anteriormente, com os gregos, era necessário um sistema de memória cerebral, utilizado para facilitar a lembrança de determinadas informações. Não havia, para tanto, a confiabilidade na palavra escrita, mas em associações feitas a partir da relação do homem com emoções, espaços e objetos, responsáveis por trazer a lembrança à memória humana. Mas os sumérios promoveram a possibilidade do arquivamento, o que mudou essa relação, já que a partir de então foi possível confiar em um outro para lembrar. Para isso, entretanto, era necessário espaço, sendo preciso calcular os custos de tal preservação. A pergunta da vez era, dessa forma: “o que podemos guardar?”, já que não era possível armazenar tudo, diante da ausência de espaço e de capital (RUMSEY, 2016).

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No século XXI, a relação do homem com a memória se transformou ainda mais. A partir do ciberespaço, vivenciamos a lacuna material, diante do emaranhado de dados, no qual não há objetos, apenas bits. A Web 2.0, protagonista desse contexto, permitiu o início de uma cultura participativa (JENKINS, 2014), na qual o sujeito anônimo ganhou voz, podendo também produzir conteúdo. Além disso, a partir do intercruzamento da dados, houve o surgimento de uma inteligência coletiva (LÉVY, 2003), responsável por transformar as mais diversas relações sociais, inclusive a dialética do lembrar e do esquecer e, naturalmente, a própria memória coletiva, que se tornou fragmentária, não sendo ela tão influenciada por instituições, como outrora. Nesse mundo digital, no qual os arquivos ganham as nuvens e são visualizados em uma tela repleta de pixels, a pergunta de ordem mudou. Antes, nos preocupávamos com o que era necessário guardar. Hoje, a questão que parece urgente é refletir sobre o que é necessário esquecer.

Referências

JENKINS, Henry. Cultura da Conexão: criando valor e significado pela mídia propagável. São Paulo, 2014.

LÉVY, Pierre. A inteligência coletiva: por uma antropologia do ciberespaço. São Paulo: Loyola, 2003.

RUMSEY, Abby. When are no more – how digital memory is shaping our future? London: Bloomsbury, 2016.

SILVA, Juremir Machado. As Tecnologias do Imaginário. Porto Alegre, Sulina, 2006.